Escrita, alteridade e posteridade
A representação
do pensamento por meio da escrita, para mim, é um exercício que tem como
resultado dois treinos quando escrevo, o treino de se colocar no lugar do outro
e o de interação com o outro – a alteridade da escrita. Quando escrevo, ou
melhor, manuscrevo, porque é assim que prefiro, estou organizando minhas ideias
e as registrando, possibilitando assim o diálogo com aquele que não está
presente no espaço, nem no tempo. Quando faço esse registro eu crio a
possibilidade de que o outro também reflita sobre o que escrevi quando o ler. A
minha escrita provoca no leitor a prática de pensar sobre aquilo, interpretar e
concordar ou não; e o mais interessante é o fato de esta interação poder
ocorrer em momentos muito distintos e em contextos diversos – a posteridade da
escrita.
O mais
prazeroso é saber que a interpretação está sempre aberta e depende do outro; é
um diálogo futuro. O fato de este registro das ideias poder servir de
identificação, embasamento, contraste, reconhecimento, provocação, libertação,
oposição, memória viva, por si só já o torna interessante e construtivo. O ser
humano faz constantemente releituras; de si mesmo, de obras escritas e não
escritas, de contextos históricos e também interage com a própria releitura.
A produção
escrita liberta, ajuda a organizar e a materializar o pensamento, possibilita a
incessante releitura e mantém vivo o registro daquilo que se altera ao longo do
tempo, daquilo que é lapidado. Inúmeras vezes interpreto uma obra sem perceber
minha própria influência nesta interpretação. Incontáveis vezes compreendo a
mesma obra de maneira distinta quando a releio, e assim concluo que esta releitura
depende de quanto estou atenta às influências internas e externas. É um ato
constante, típico daquele que se altera, que é esculpido pelas experiências e
pela vivência, muda as próprias qualidades, incessantemente. E aqui a interação
contida no conceito de alteridade é evidenciada com o sentido de auto interação.
Também aqui impera o sentido de diálogo futuro, a posteridade.
A escrita,
independentemente do reconhecimento, vai construindo a história muito
particular de quem escreve. Ela também vai registrando a construção do
pensamento do autor e sua evolução. A escrita é um convite permanente ao
diálogo, a qualquer tempo, em qualquer lugar ou circunstância, com qualquer
leitor.
by Ale Madia
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