Armaduras
Armaduras são
compostas por um conjunto de peças metálicas que servem para proteger, em tese,
quase completamente alguém em combate. Armadura é, supostamente, uma defesa. Essas
armaduras foram largamente utilizadas no período medieval onde as batalhas
sangrentas foram o meio encontrado para a disputa pelo poder, pela influência,
por território, entre outras contendas. A defesa era algo indiscutível,
necessária, haja vista o ataque iminente. O ataque era um instrumento natural
em sociedades medievais e precárias. A justificativa para uma ofensiva era
diversa. As armaduras eram úteis e parte de um modo de vida, primitivo. As
sociedades evoluíram e as armaduras foram reformuladas. Todavia, os atos
agressivos nunca saíram de cena e a defesa se tornou um sistema complexo. As
ações destruidoras sempre existiram e é lamentável a constatação de que sempre
existirão. As armaduras do passado são hoje peças para museus, importantes para
a compreensão da história, interessantes e relevantes para o conhecimento e
reflexão.
Contudo, as
armaduras de 2022 são variadas e sofisticadas, por vezes são vestimentas
confortáveis, às vezes são digitais e dinâmicas, de vez em quando são morais e
adaptáveis, ocasionalmente são culturais e moldáveis, de quando em quando são
econômicas e impostas, e essas são as armaduras estruturantes existentes. As
sociedades de 2022 ainda se envolvem em muitas batalhas, infelizes e
contraproducentes. Os atos violentos atuais são mais elaborados, condizentes
com uma realidade mais intrincada e cada vez mais desafiadora. Assim sendo, a
defesa ou reação se tornaram itens quase inquestionáveis. Os combatentes ainda
possuem um aspecto rudimentar, a mesma ânsia e a ganância, talvez a
agressividade ainda mais exacerbada. Em 2022 o mecanismo de defesa se vale de
muitas versões diferentes dos mesmos fatos, a retórica equivocada é uma arma,
por vezes atraente e convincente. Ao longo do tempo o intelecto foi capaz de
criações geniais e também repugnantes. A atração irresistível pelo poder, a
sede de domínio, a crença na força bruta, a ignorância e a intolerância, tudo isso
somado ao desequilíbrio intelectual e emocional produzem o cenário doentio dos
nossos tempos. Todas essas questões contribuem para a criação de armaduras
contemporâneas e para a descoberta de outras capacidades.
Aliás,
armaduras essas que são usadas, inclusive, como verdadeiras armas. A capacidade
em si também se tornou uma armadura eficiente para nossas sociedades. As
diversas armas atuais não são apenas coadjuvantes, o acesso às armaduras é
desigual e a obtenção de escudos é desproporcional. Ataque e defesa, uma dupla
medieval e ainda moderna. A explicação para tamanha obstinação por essa dupla
nunca esteve nos campos de batalha apenas, mas também nas arenas de mentes
constantemente nutridas pelo enfrentamento, disputas, privilégios e vantagens. Essas
são mentes que exploram as oportunidades adversas e conduzem barbáries, mentes
de gente protegida por armaduras próprias, institucionais e alheias. A
complexidade das armaduras da modernidade é, sem dúvida, um enorme desafio para
pavimentar a pacificação. Outra questão preocupante é que a mentalidade está em
dissonância com a realidade, aparente e infelizmente. O tipo de armadura
dominante de nosso tempo é a discursiva, primeira e indiscutivelmente. Porém o campo
primário de batalha não é apenas a mente humana e seus conflitos internos, pois
as retóricas são externalizadas e provocam reais consequências, com ou sem
constrangimento ou dificuldades.
Ainda que os
tempos sejam outros e que o período medieval tenha ficado distante, descobrimos
que as armaduras são peças demandadas pelas atuais circunstâncias. A agressão
física é a manifestação mais primitiva de uma mente, até mesmo de gente. O ataque
verbal é a manifestação da precariedade e da imaturidade de uma mente, de
qualquer tipo de gente. As armaduras de hoje não conseguem conter a falta de
civilidade, apenas tentam esconder ou proteger o dono da insanidade. Importante
salientar que as armaduras institucionalizadas não são adequadas quando são
cegamente idolatradas. Algumas armaduras contemporâneas servem como trajes,
ultrajantes. As armaduras e as armas não são, definitivamente, apropriadas para
mentes pensantes. As armaduras, por mais imponentes, não são substitutos
inteligentes para o discernimento. E as armas não deveriam mais figurar por
esses atuais tempos. Essas armaduras de 2022 são controversas ferramentas para
ilusões, não parecem ser duradouras proteções. A sanidade de uma sociedade mentalmente
evoluída seria o melhor escudo para os conflitos inevitáveis, mas contornáveis.
Mentes armadas, armaduras compartilhadas, duelos institucionalizados, multitude
de arbitrariedade e ineptos, retratam sociedades estilhaçadas.
by Ale Madia
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