Repertórios do hoje

 

Já podemos começar pelo fim, afinal o hoje impõe sua pressa característica. Os repertórios atuais oscilam entre o jocoso e o insólito. Repertórios simplistas para a atualidade complexa vieram para ficar!? Devemos nos acostumar!? A sonoridade de tais repertórios é a senha para decodificar e remodelar tudo aquilo que se pretenda. Para um perfeito suco de mundo basta agitar e experimentar. Receita para deliciar equivocados e maravilhar insolentes. No cardápio do hoje tem de tudo, salgado, azedo, picante...e seguem temperando, sem parar.

Servem à vontade infinitas possibilidades para extraordinários futuros, tudo devidamente liquidificado e amplificado. Repertórios revolucionários para que nada se pareça com o hoje estragado. Soluções para problemas inventados e muita pressa para atingir todas as metas. Torta de gente irreverente para acompanhar o suco de mundo impalatável. Embalagem vistosa para acomodar dificuldades antigas e entrega expressa, esse repertório é apetitoso e infalível para degustação. No hoje podemos experimentar tudo, só não devemos congelar para o amanhã.

No repertório incerto para o amanhã é permitido desconstruir para atrair, e depois mesclar outras fórmulas para tempos e realidades ainda mais interessantes. O enredo convidativo está em constante aprimoramento e oferece sabores improváveis. Tem um pouco de tudo misturado: o intragável cremoso, o delírio licoroso, a arrogância crocante, a espuma brilhante, tem para todos os gostos e paladares. Tem muita opinião, falta exatidão, então é sucesso garantido; para o hoje. Adicionar rapidamente um toque inusitado é uma tarefa cotidiana para esses tempos acelerados. O silêncio e a assertividade sustentável não fazem parte dos repertórios do hoje. O hoje é vocal e transitório, por sua vez, banal. Amargo e indigesto.

Na compilação de repertórios do hoje, nuances imprecisas, anomalias inerentes e convincentes, velocidade, mistura de invólucros, e abordagens erráticas dominam o cardápio. É um tipo de serviço, ou desserviço, da modernidade; apropriado para os famintos e sedentos do hoje, que desconhecem ou não apreciam os sabores e especiarias da culinária do ontem. É uma apressada acomodação de ingredientes num prato raso e precário, mas isso não é um problema para o hoje. Se o for para mais adiante, ainda assim não cabe no fervente hoje. Talvez possa ser uma sugestão de uma polpa doce para a sobremesa, do amanhã. Quem sabe até servida numa bela taça!?

 

by Ale Madia

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